quinta-feira, 18 de novembro de 2010

All you need is love

Estou fazendo o final do meu internato na enfermaria pediátrica do Hospital Federal de Bonsucesso.

Lá pude aprender, dentre outras coisas, como muitas vezes as internações são mais sociais do que por motivos de doença.

Temos uma paciente de 10 anos internada por razões patogênicas sim (aliás, um caso um tanto quanto complicado), mas, que também tem fortes questões sociais. Essa menina parece ter sofrido maus tratos pelo pai, não faço a menor idéia do que acontece com a sua mãe, o que sei é que ela, com seus 10 anos de idade, recebe apenas visitas esporádicas de sua avó. Para quem não sabe, crianças tem sempre direito a acompanhantes em suas internações, não estão restritas a visitas, podem ter sempre um familiar com elas.

Nunca tive uma paciente tão carinhosa. Não tenho muita prática, não tenho muita experiência, mas, dentro do pouco que vivi, essa fofa se destaca sem dúvidas. Quando chego para examiná-la, ela (que não fala mas interage bem com o examinador), faz uma festa! Me puxa, me abraça, me beija, e, as vezes, pede para que eu coce suas costas. Adora que eu pegue o hidratante e passe nela, ou que dê para que ela passe. Tem um reloginho de pulso roxo que ela adora usar, e gosta também de colorir. E sempre quando eu tenho que deixá-la para seguir com minhas obrigações parte-se um pedaço do meu coraçãozãozinho, pois ela nunca quer que eu vá.

Essa menina me mostra a cada dia a importância do amor. De receber, sem dúvida, mas, principalmente, de dar. A importância das relações, do carinho e do respeito. A importância de um atendimento humanizado e individualizado para um prognóstico positivo das doenças. E, mais do que isso, como devemos tratar todos bem, com respeito, com leveza, com educação, aquela história que a Igreja prega de "amor ao próximo". E olha que da última vez que eu chequei eu era uma pessoa agnóstica.
Sem dúvida esta mocinha com o amor que vem recebendo da equipe que a acompanha, vem apresentando consideráveis melhoras. E com o amor que vem distribuindo por lá ela vai tocando diversas pessoas, bem como meu tocou, de diversas formas distintas, conferindo a estas um novo ponto de vista, uma nova direção no caminho para a evolução ou qualquer coisa parecida que as pessoas busquem em suas existências.
Preciso aqui destacar e elogiar a equipe de enfermagem da pediatria do HGB. Elas são as pessoas que mais acompanham e, com maior proximidade, os pacientes internados. Atendem com muito carinho aquelas crianças, e nesses "casos sociais" que lotam aquele lugar, são elas quem compram xampú, sabonete, hidratante, etc, para a higiene dessas crianças.
Tem também voluntários que fazem visitas e levam presentes, além dos doutores da alegria, que são palhaços que vão a enfermaria para fazer espetáculos e contar histórias para as crianças.

É muito triste ver alguém tão jovem, tão despreparado, tão indefeso, tão inocente sem o seu porto-seguro principal (a família) para ofertar estabilidade em qualquer momento da vida, em especial nos momentos difíceis como são as internações. Mas, como costumo fazer com tudo na vida, tento focar no lado bom e notar como, se a gente souber olhar, até mesmo num lixão uma flor pode nascer.

Eu também dou um plantão as quartas feiras, como acadêmica (lógico), num pronto-socorro infantil do SUS em São Gonçalo. Ontem eu atendi um menino institucionalizado, a mãe dele morreu de câncer, o pai mora no Espírito Santo e ele não conhece. Ele me disse que a coisa boa que tinha na vida dele era que a avó dele em breve iria adotá-lo.

Para essas, e todas as crianças eu desejo tudo de bom do mundo, que tudo corra bem, que o amor que algumas pessoas ofertam a elas possa permitir a recuperação, a abertura de portas, e uma vida próspera, longa e boa.
Para os adultos que as cercam eu deixo a mensagem que a música dos Beatles enfatiza bem: All you need is love. E desejo que as pessoas possam ter a clareza da importância e do impacto que suas atitudes tem.

Com muito amor,
Valentina

PS:. O título é link para um vídeo bom dos Beatles de All You Need Is Love

10 comentários:

  1. Bonito, Valê. Parece que um espírito natalino já envolve teu coraçãozinho, hem?
    Mas, para descontrair: a parte da menina gostar que passe um hidrante nas costas foi engraçada. Acho que você quis dizer hidratante, não?
    :)
    beijoca,
    Mari

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  2. "Adora que eu pegue o hidrante e passe nela" -> Isso isolado e vindo de moi.... HAHAHAHAHAHA

    Tive que consertar, não dava prá deixar assim.

    Clichêzãozão meu texto, né? Eu sei... Mas esses diabos dessas crianças acabam comigo, hahahahaha.

    Beijos

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  3. PS:. Gostou do vídeo? Viu?
    Ah, minha música das pedras rolantes favorita da última semana: Memory Motel, do cd véio pro mundo e novo para mim Black and Blue. Googla aí.
    Beijos e saudades mil

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  4. haha, não quis dizer que era clichê, achei tocante e tocado, entende? Você estava emocionada pela menina, isso é bonito, isso engrandece. E isso que eu escrevo, aí sim, é clichê.
    ;)
    Mari

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  5. Vale, chorei ao ler o seu lindo texto. Haja coracao para primeiro trabalhar como "medica" e segundo com criancas.
    Uma das mais "humanas" e importantes profissoes que conheco.
    Continue sempre "olhando" e tratando os seus pacientes com o seu jeitinho especial de ser.O Mundo seria muito melhor com mais profissionais como voce.
    Beijo no seu coracao
    Tia

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  6. Muito emocionante o seu texto. Com amor tudo se torna mais facil.
    E você escreve muito bem. Va colecionando suas experiências e quem sabe teremos mais tarde um livro...
    Estou orgulhosa de você
    Beijos
    vovó

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  7. Isso, um livro!!
    Minha mãe fala pro meu irmão fazer isso também, quem sabe não vira um livro só? Histórias de saúde, em saúde, com saúde...
    beijo,
    Mari

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  8. Vocês são demais! Acho que me aproximo cada vez mais da escrita com o pensamento no mestrado...
    Um livro é uma boa idéia, quem sabe quando tiver mais bases e mais histórias?!

    Beijos beijos e mais beijos,
    Valê

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  9. Darling, love can be cliche at times, and that's ok. I am glad for those kids that you can help them heal with something other than medication, if you catch my drift. Besides, it was great "eavesdropping" on your chat with Mari. Boy, I really miss her. ;-)Ms. B.

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